O Segredo dos Isquiotibiais de Aço: Por Que o Nordic Hamstring Exercise (NHE) Reduz as Lesões em 50%?

O Segredo dos Isquiotibiais de Aço: Por Que o Nordic Hamstring Exercise (NHE) Reduz as Lesões em 50%? Se você está no mundo dos esportes de alta velocidade — como futebol, rugby, atletismo ou basquete — provavelmente já viu ou sofreu uma lesão nos isquiotibiais. Infelizmente, essa é uma das ocorrências mais comuns e frustrantes no meio esportivo. O Nordic Hamstring Exercise (NHE), ou Exercício Nórdico para Isquiotibiais, emergiu como a ferramenta de prevenção mais popular e eficaz. Mas o que exatamente torna o NHE tão poderoso? Uma rigorosa revisão sistemática e meta-análise investigou a fundo os mecanismos de adaptação por trás deste exercício. Os resultados são claros: o treino nórdico atua diretamente em dois dos principais fatores de risco modificáveis para a lesão dos isquiotibiais. Este artigo vai desvendar os achados científicos, mostrando como o NHE constrói músculos mais fortes e mais longos, capazes de resistir à intensidade do esporte de alto nível.

Lino Matias

12/5/20255 min read

1. Epidemia no Esporte: A Incidência das Lesões Musculares

As lesões musculares representam um fardo pesado para atletas e clubes.

Elas são responsáveis por uma parcela significativa de todos os incidentes no esporte, variando de 10% a impressionantes 55% do total de lesões.

  • No grupo dos membros inferiores, cerca de 92% das lesões afetam quatro grupos musculares principais: isquiotibiais, adutores, quadríceps e panturrilha.

  • Dentre eles, os músculos isquiotibiais são, de longe, os mais atingidos.

As Lesões de Isquiotibiais (HSI) causam, em média, um afastamento de 17 dias para casos moderados. No entanto, 15% delas são consideradas graves, exigindo mais de 28 dias de recuperação.

O problema é agravado pela alta taxa de reincidência, especialmente quando o músculo bíceps femoral está envolvido, chegando a 18,4%.

Essa combinação de alta incidência, tempo de inatividade e risco de nova lesão compromete o desempenho do atleta e gera consequências financeiras negativas para as equipes.

2. Dois Fatores de Risco Modificáveis: Força Excêntrica e Arquitetura Muscular

Com o objetivo de combater os efeitos deletérios das HSI, a pesquisa científica se concentrou em identificar os fatores de risco que podem ser alterados pelo treinamento.

Os fatores de risco para lesões podem ser divididos em:

  • Não Modificáveis: Idade, genética e histórico de lesões anteriores.

  • Modificáveis: Flexibilidade, fadiga, força excêntrica e comprimento do fascículo.

Dois desses fatores modificáveis têm recebido atenção especial na última década, sendo cruciais para a prevenção de lesões.

2.1. A Importância da Força Excêntrica dos Isquiotibiais

A força excêntrica é a capacidade do músculo de produzir força enquanto se alonga — um movimento fundamental durante a fase final da corrida de alta velocidade, quando o isquiotibial deve desacelerar rapidamente o movimento da perna.

Atletas de elite que apresentavam fraqueza excêntrica nos flexores do joelho (abaixo de 337 N) tinham um risco 4,4 vezes maior de sofrer uma HSI.

O treinamento de sobrecarga excêntrica, onde a força é aplicada durante o alongamento do músculo, demonstrou gerar maiores ganhos de força e parece ser mais eficaz que o treino concêntrico para prevenir lesões. É exatamente aqui que o NHE se encaixa.

2.2. O Papel Chave do Comprimento do Fascículo do Bíceps Femoral

A arquitetura muscular, especialmente o comprimento do fascículo da cabeça longa do bíceps femoral, é um preditor de risco extremamente promissor.

  • Fascículos musculares mais curtos significam maior suscetibilidade à lesão.

  • Em jogadores de futebol profissional, fascículos com menos de 10,56 cm no pré-temporada aumentaram o risco de HSI em 4,1 vezes.

As estratégias de treinamento que conseguem aumentar tanto a força excêntrica quanto o comprimento do fascículo são vitais para a prevenção de lesões.

3. O Poder do NHE: Mecanismos de Adaptação Comprovados pela Ciência

O Exercício Nórdico para Isquiotibiais (NHE) se estabeleceu como uma estratégia comprovada, sendo capaz de reduzir a incidência de HSI em até 50%. A meta-análise buscou entender o porquê desse efeito preventivo ser tão robusto.

Os resultados confirmaram que o treinamento Nórdico é uma estratégia válida para melhorar ambos os fatores de risco modificáveis.

3.1. Ganhos Impressionantes na Força Excêntrica (Resultados da Meta-Análise)

O treino baseado no NHE gerou aumentos significativos na força excêntrica dos flexores do joelho em todos os estudos analisados.

Os ganhos de força observados variaram de acordo com o método de avaliação:

  • 10% a 15% de aumento nos testes realizados em dinamômetros isocinéticos (equipamentos de laboratório).

  • 16% a 26% de aumento nos testes realizados em dispositivos específicos para o próprio NHE.

A meta-análise consolidou esses dados, demonstrando que o treinamento Nórdico é altamente eficaz para o aumento da força excêntrica.

3.2. Alongamento do Músculo: Aumento do Comprimento do Fascículo

O aumento do comprimento do fascículo da cabeça longa do bíceps femoral é um dos achados mais importantes da pesquisa.

O alongamento do fascículo muda as relações força-velocidade e força-comprimento do músculo, tornando-o mais resistente ao estiramento e à lesão.

O treinamento com NHE resultou em aumentos significativos no comprimento do fascículo:

  • Os estudos observaram ganhos entre 12% e 22% no comprimento do fascículo.

  • A meta-análise confirmou o efeito positivo e significativo do NHE nessa arquitetura muscular.

Em termos de prevenção, um aumento de apenas 11% no comprimento do fascículo pode diminuir a probabilidade de HSI em aproximadamente 21%. Por outro lado, seria necessário um aumento de pelo menos 50% na força excêntrica para atingir uma redução de risco similar, o que é um ganho de força muito difícil de ser alcançado em atletas bem treinados.

Isso sugere que a mudança na arquitetura muscular — o alongamento do fascículo — pode ser o principal mecanismo por trás da eficácia preventiva do NHE.

4. O Protocolo Ideal: Como Incorporar o Treinamento Nórdico na Sua Rotina

Embora os benefícios do NHE sejam claros, os protocolos de treinamento variaram entre os estudos, incluindo desde 4 até 17 semanas de duração, com diferentes frequências semanais e volumes totais.

Para quem busca implementar o Treinamento Nórdico na rotina, algumas considerações são importantes:

  • Frequência e Volume Semanal: Os protocolos mais eficazes envolveram o exercício de 1 a 3 vezes por semana.

  • Duração Mínima: A maioria dos estudos com resultados positivos teve uma duração de treinamento de 4 a 12 semanas.

  • Volume de Repetições: O número de repetições e séries variava, mas a progressão da carga de trabalho é um fator-chave.

    • Programas de alto volume (maior número total de repetições) tendem a gerar maiores ganhos de força excêntrica.

    • No entanto, estudos sugerem que o comprimento do fascículo pode ser aumentado mesmo com programas de baixo volume, o que é uma excelente notícia para clubes com calendários apertados.

A adaptação no comprimento do fascículo pode ocorrer rapidamente, em apenas um mês de treinamento. Isso é especialmente útil em períodos curtos como a pré-temporada, permitindo que os atletas comecem o período competitivo com um músculo mais resistente.

Conclusão: A Ciência por Trás da Prevenção

O Nordic Hamstring Exercise é mais do que uma tendência de treino; é uma intervenção comprovada cientificamente.

A meta-análise esclareceu os dois principais pilares que sustentam seu efeito preventivo: o aumento da força excêntrica e a modificação da arquitetura muscular através do aumento do comprimento do fascículo.

Para treinadores, preparadores físicos e atletas, a mensagem é clara: o NHE deve ser uma parte essencial de qualquer programa de prevenção de lesões. Ele não só torna os isquiotibiais mais fortes, mas os transforma estruturalmente, oferecendo uma blindagem eficaz contra as temidas lesões que interrompem carreiras.

Ao incorporar o exercício Nórdico de forma consistente, os atletas podem reduzir significativamente o risco de lesão e manter o foco na performance de alto nível.

REFERÊNCIA: Medeiros DM, Marchiori C, Baroni BM. Effect of Nordic Hamstring Exercise Training on Knee Flexors Eccentric Strength and Fascicle Length: A Systematic Review and Meta-Analysis. J Sport Rehabil. 2020 Oct 12;30(3):482-491. doi: 10.1123/jsr.2019-0388. PMID: 33049705.