O Segredo da Força Explosiva: Como o Treinamento Concorrente Afeta Mulheres Atletas!

Descubra os resultados surpreendentes de um estudo recente sobre como a combinação de treinamento de força e treinamento de resistência (endurance) impacta diferentes grupos de mulheres. Se você é uma atleta ou está pensando em incorporar a força na sua rotina, este artigo é essencial para entender os limites e as possibilidades do treinamento concorrente!

Lino Matias

12/2/20255 min read

A Polêmica do Treinamento Concorrente

O treinamento concorrente, que é a prática de combinar treino de força e de endurance no mesmo programa, tem sido um tema de debate acalorado na ciência esportiva por décadas. Desde o estudo pioneiro de Hickson em 1980, tem sido sugerido que essa combinação pode atenuar os ganhos de força máxima e, em alguns casos, até mesmo prejudicar a hipertrofia muscular (o aumento do tamanho do músculo).

Entretanto, nem todos os estudos chegam à mesma conclusão. Uma quantidade significativa de pesquisas relata não haver efeitos negativos do treinamento concorrente nas adaptações relacionadas à força e à hipertrofia. Essa inconsistência nos resultados levanta a questão: o que realmente determina se o treinamento concorrente irá atrapalhar seus ganhos?

  • Fatores de Confusão: As diferenças nos resultados parecem estar ligadas a vários fatores metodológicos.

  • Status de Treinamento: O nível de treino dos participantes (atletas experientes vs. destreinados) é crucial.

  • Volume e Frequência: O volume e a frequência do treino de força e de endurance também influenciam.

  • Modalidade: O tipo de exercícios e a forma como são integrados são importantes.

Curiosamente, a interferência negativa é frequentemente observada em adaptações relacionadas à potência e em atividades que exigem altas velocidades de contração muscular, como a capacidade de salto (SJ e CMJ).

O Estudo: Comparando Atletas e Iniciantes no Treino de Força

Para trazer mais clareza ao tema, um estudo se propôs a investigar se as atletas de endurance, ao adicionarem um programa de força à sua rotina, experimentariam uma atenuação nos ganhos de força em comparação com mulheres sedentárias (não treinadas) que faziam apenas o treino de força.

Grupos de Participantes e Metodologia do Treino

O estudo envolveu dois grupos distintos de mulheres:

  1. Grupo E+S (Endurance + Força): Onze atletas de endurance (ciclismo e corrida), bem-treinadas e com uma média de 5.1 ± 1.1 horas de treino de endurance por semana. Nenhuma delas havia feito treino de força sistemático nos 12 meses anteriores.

  2. Grupo S (Somente Força): Dez mulheres previamente destreinadas (sedentárias).

Ambos os grupos realizaram exatamente o mesmo programa de treinamento de força de 11 semanas, com duas sessões por semana, focando em quatro exercícios para as pernas, com 3 séries de 4 a 10 repetições máximas (RM).

O design do estudo foi estratégico: as atletas E+S mantiveram seu treino de endurance, que estava em um nível estável, e adicionaram o treino de força. Isso garantiu que o aumento no volume total de treino fosse semelhante em ambos os grupos ao longo das 11 semanas.

Avaliações de Força e Hipertrofia

As participantes foram avaliadas antes e depois da intervenção para diversas variáveis, incluindo:

  • Massa Magra nas Pernas (Leg_LM): Avaliada por DXA (Dual-energy X-ray absorptiometry).

  • Força Máxima em Baixa Velocidade (1RM): Avaliada no leg press unilateral (uma repetição máxima).

  • Torque Isométrico Máximo (MVC): Avaliado na extensão do joelho.

  • Pico de Torque em Alta Velocidade: Avaliado na extensão do joelho a 240°/s-1.

  • Desempenho de Salto: Avaliado através do Squat Jump (SJ) e do Counter Movement Jump (CMJ).

Adaptações ao Treino de Força: O Que Foi Semelhante

Os resultados trouxeram boas notícias para as atletas! Em algumas das medidas mais importantes do treino de força, não houve diferença estatística nos ganhos entre o grupo de atletas que combinou os treinos (E+S) e o grupo que fez apenas força (S).

Ganhos na Força e Massa Muscular

Ambos os grupos demonstraram aumentos significativos e semelhantes nas seguintes variáveis:

  • Aumento de 1RM no Leg Press Unilateral: E+S aumentou 39 ± 19%, enquanto S aumentou 42 ± 17%.

  • Aumento de Torque Isométrico Máximo (MVC): E+S aumentou 12 ± 11%, e S aumentou 8 ± 10%.

  • Aumento de Massa Magra nas Pernas ($\text{Leg}_{\text{LM}}$): Ambos os grupos aumentaram cerca de 3%.

  • Progressão na Carga de Treino (6RM): A progressão da carga de 6RM ao longo das 11 semanas foi praticamente idêntica: E+S 39 ± 11% vs. S 40 ± 11%.

Esses resultados sugerem que o treinamento concorrente, com uma carga semanal de endurance de cerca de 5 horas, não prejudicou a capacidade das atletas de desenvolver força em baixas velocidades de contração ou de alcançar hipertrofia muscular.

Onde Houve Diferença: A Potência é Atenuada

Embora os ganhos de força bruta (1RM, MVC) e massa muscular tenham sido semelhantes, o cenário mudou drasticamente quando o foco foi a capacidade de gerar força em altas velocidades de contração, ou seja, a potência muscular.

O Efeito de Interferência na Potência

O grupo que realizou somente o treino de força (S) demonstrou ganhos superiores nas seguintes variáveis, que são indicadores de potência e velocidade de contração:

  • Aumento no Salto Agachado (SJ): O grupo S teve um aumento de 14 ± 7%, significativamente maior que o aumento de 8 ± 6% do grupo E+S.

  • Aumento no Pico de Torque em 240°/s-1: O grupo S aumentou 15 ± 7%, quase o dobro do aumento de 8 ± 5% do grupo E+S.

A diferença no aumento da capacidade de salto e do torque em alta velocidade sugere fortemente que o treinamento concorrente atenuou as adaptações relacionadas à capacidade de desenvolver força em velocidades musculares de contração mais altas.

  • Implicação: Isso apoia a ideia de que o treinamento concorrente interfere especificamente nas adaptações relacionadas à potência.

Por Que a Potência Sofre Mais?

A capacidade de gerar potência e força rapidamente depende de diversos fatores, como:

  • Fibras Musculares de Tipo II: A proporção de fibras de contração rápida.

  • Ativação Neural Rápida: A velocidade com que o sistema nervoso ativa os músculos.

Embora o treino concorrente não pareça afetar as fibras de Tipo II , estudos anteriores sugerem que ele pode reduzir as adaptações neurais rápidas e voluntárias.

Conclusão: Otimizando Seu Treino de Força e Endurance

A principal conclusão deste estudo é clara: mulheres atletas de endurance que adicionam um treino de força à sua rotina (cerca de 5 horas de endurance por semana) podem esperar ganhos comparáveis aos de indivíduos destreinados em termos de força máxima e hipertrofia muscular.

No entanto, essa combinação de treinos resultou em um menor aumento na potência muscular e na capacidade de gerar força em altas velocidades.

O que isso significa para o seu Treinamento Concorrente?

  • Se o seu objetivo principal é a força máxima e o aumento da massa muscular (Leg_LM): O treinamento concorrente parece ser eficaz, especialmente com um volume de endurance moderado (cerca de 5h/semana).

  • Se seu foco principal é o desenvolvimento de potência (salto, velocidade, explosão): O efeito de interferência pode ser uma preocupação. Talvez seja necessário modular seu volume de endurance ou o posicionamento das sessões de treino para maximizar seus ganhos de potência.

É importante notar que o volume de treino de endurance das atletas neste estudo (5 h/semana) foi inferior ao de estudos anteriores que encontraram uma interferência negativa mais ampla (cerca de 10 h/semana), sugerindo que o volume total de endurance é um fator crucial.

Se você busca ganhos de força e hipertrofia sem comprometer seus resultados de endurance, pode ficar tranquila: o treinamento de força para atletas é compatível com seus objetivos. Mas, se a potência explosiva é o que você busca, talvez seja necessário ser mais estratégica no seu treino de força e resistência para contornar o efeito de atenuação.

REFERÊNCIA: Vikmoen O, Raastad T, Ellefsen S, Rønnestad BR. Adaptations to strength training differ between endurance-trained and untrained women. Eur J Appl Physiol. 2020 Jul;120(7):1541-1549. doi: 10.1007/s00421-020-04381-x. Epub 2020 May 5. PMID: 32372216; PMCID: PMC7295735.